10.1.08

Rio: Ipanema

Piscina do Fasano com vista para o Morro Dois Irmãos, D.R.


“Cariocas são bonitos / Cariocas são bacanas / Cariocas são sacanas / Cariocas são dourados / Cariocas são modernos / Cariocas são espertos / Cariocas são diretos / Cariocas não gostam / De dias nublado” (Cariocas, Adriana Calcanhotto). O Arpoador, na divisa entre Copacabana e Ipanema, passou a ter um rival de peso na cobertura do novo hotel Fasano Rio na hora de admirar o mais elogiado pôr-do-sol da cidade. É também aqui que encontro a piscina, com serviço de bar, mais bonita de toda a cidade, com direito, para além do já citado fim de tarde, a vista desafogada para toda a marginal que se estende de Ipanema ao Leblon, entre a pedra do Arpoador, de um lado, e o Morro Dois Irmãos, do outro.


Fasano na esquina da Vieira Souto com a Joaquim Nabuco, D.R.


O Fasano, mais um nome de São Paulo que chega ao Rio para marcar a diferença, abriu as suas portas em Agosto de 2007. Instalado num prédio de oito andares, discreto mas que dá logo no olho, este Fasano depressa se tornou o ícone do novo Rio chique, apesar de ainda não estar tão afinado em matéria de serviço como o seu irmão paulistano. Seja como for, Rogério Fasano não brinca em serviço; quando se juntou aos outros investidores no projecto, já eles tinham então contratado o designer de interiores Philippe Starck, não abdicou de ter uma palavra a dizer.


Poltrona Big Mamma, de Gaetano Pesci, no corredor do Fasano, foto de JMS


Da “fricção” de génios e pontos de vista divergentes, nasceu um consenso que se traduz no seguinte: a classe de Rogério sente-se, sobretudo, na recepção (lindo o balcão de cinco metros e seis toneladas, todo escavado num tronco único de pequiá), no lobby (onde mistura reproduções de mobiliário brasileiro dos anos 50 e 60 com marcas registadas de Starck como os enormes espelhos ou as cortinas a separar ambientes, mas aqui em palha de seda), no Londra (o bar do momento, com quase 100 capas de LP’s da sua colecção privada a forrar as paredes) e no restaurante Fasano al Mare (a cargo do chef Luca Gozzani, Rogério bateu o pé que queria colunas como as do aeroporto Santos Dumont, mas permitiu os lustres fabulosos de Murano). Já Starck teve maior “liberdade” na piscina, nos corredores (foi sua a ideia de colocar as poltronas Big Mamma, de Gaetano Pesci) e nos quartos (muito confortáveis, tendo como marca registada o espelho “gota de água”, também utilizado para reflectir a paisagem).


Uma das suites topo de gama do Fasano, D.R.


Foi um investimento brutal, que implicou importar material topo de gama dos quatro cantos do mundo. Com um total de 92 quartos, do mais simples com cama king size à suite de luxo, é certo que apenas pouco mais de 40 dão directamente para o mar. Os restantes têm de se contentar com os fundos, mas até ai a filosofia da casa prevalece e argumentam que mais vale ficar no pior quarto do melhor hotel do Rio do que num quarto medíocre com vista panorâmica. É um ponto de “vista”.


Varanda com vista lateral de um dos quartos do fundo do Fasano, foto de JMS


Além de estar a mudar o perfil do Arpoador, o Fasano, na esquina da Joaquim Nabuco com a Vieira Souto, também veio tornar mais disputado o quinhão de areal frente ao posto 8. De todas as praias urbanas do Rio, Ipanema continua a ser a preferida, mas convém não fazer confusões; cada trecho de areal carioca tem a sua identidade: o célebre posto 9, outrora símbolo do movimento hippie e da resistência à ditadura, serve de ponto de encontro para os corpos mais enxutos do Rio, ao passo que entre o 8 e o 9, face às ruas Teixeira de Melo e Farme de Amoedo, é onde se reúnem gays, simpatizantes e musas que não se importam de dar a cara (os mais discretos preferem a Reserva, no Recreio). Não por acaso, uma das novas boates da moda entre o público GLS, o 69, fica na esquina da Farme com a Prudente de Morais, ao lado da choperia Devassa.


A praia frente ao célebre posto 9, em Ipanema, D.R.

Aliás, como em muitos outros pontos da cidade, aqui é fundamental ter, mais do que uma mera noção geográfica, uma percepção de como as coisas funcionam. Por uma questão de comodidade e segurança, os cariocas apreciam ter tudo o que precisam no seu bairro. Ipanema não é diferente e se o assunto é gastronómico, rume ao Quadrilátero de Charme, cheio de restaurantes e cafés recomendados. É precisamente neste perímetro que fica a mais nova casa de dois andares do Gula Gula (Rua Henrique Dumont, 57). Tudo começou com um modesto ponto no Leblon, onde o engenheiro Fernando de Lamare, o Fernandão, queria ocupar os dias de ócio. O sucesso foi tanto que hoje, passados mais de 20 anos, o seu filho Pedro e a neta, a chef Nanda, continuam o legado. Ao lado, no número 65-A, fica a Q-Guai, onde a dupla Amanda Haegler e Maria do Rosário encantam com três colecções ao ano de propostas femininas muito vivas e joviais.



Mas, em matéria de compras, não há como escapar à Visconde de Pirajá. Com trânsito nervoso e gente apressada como quase todas as avenidas no miolo do bairro paralelas à Vieira Souto, é aqui que encontro a minha livraria preferida no Rio, a Travessa (nº572), com café e uma filial no Shopping Leblon. Só perde em programação cultural para a Letras & Expressões (nº276). Entre as duas, no número 365, não tenho como falhar a Farm. Sem vitrina, a fachada da nova megaloja de 300 m2, é linda e já é conhecida por um fenómeno muito curioso: nos dias de maior movimento, os homens ― namorados, maridos, amigos, simples curiosos ― ficam sentados ou em pé nas escadas enquanto as suas acompanhantes, que se confundem com as vendedoras, conferem as novidades. A linha, alegre, colorida e descontraída, é a “cara da carioca” e o mérito é da estilista Kátia Barros (na foto), ela mesma uma filha do Rio, criada na praia do posto 6, que, apesar da expansão do negócio, não esquece que a sua inspiração está aqui.

A calar a boca dos que acusam Ipanema de se estar a “copacabanizar”, a Garcia d’Ávila (e, até certo ponto, a Maria Quitéria), perpendicular à marginal, é mais “o Rio a querer ser os Jardins, em São Paulo”; nota-se que as melhores marcas e restaurantes capricham especialmente na sua apresentação. Por oposição, o Mil Frutas Café, que ocupa uma loja para lá de acanhada no número 534-A, arriscava-se a passar despercebida, não fosse serem aqui vendidos os gelados mais amados da cidade.

3 comentários:

Custódia C. disse...

Miguelito
Ando um bocado ocupada, mas hoje parei para ler estes teus textos cariocas.
Gostei muito da introdução "poemária" :) Muito bem colocada!
Como sempre ficamos com vontade de apanhar o primeiro avião ... e tens aí fotografias muito boas :) já não basta escrever bem, não?

Luís F. disse...

Bem... Essa piscina é qualquer coisa!

marta r disse...

Fiquei impressionada com o balcão de seis toneladas e de um tronco único!!!!