4.12.06

Programa de Domingo

(Procissão de Corpus Christi, Amadeo de Souza Cardoso)

Parte um

Amadeo de Souza Cardoso. Não foi à primeira, mas, à segunda, foi de vez. Munidos das melhores intenções, eu e M. apanhámos um grande balde de água fria quando, no domingo a seguir à inauguração da exposição, chegámos todos confiantes à Gulbenkian, às 16 horas, e não pudemos entrar. Pensámos em voz alta: mas onde é que estamos? Aos domingos não são só os centros comerciais e os estádios que enchem? Aprendida esta primeira lição, e estupefactos com os números divulgados (mais de 15 mil visitantes nos primeiros dez dias), resolvemos esperar por tempos melhores.

(Amadeo de Souza Cardoso)


Foi o bem que fizemos, pois, graças ao fenómeno de popularidade em que se tornou Souza Cardoso, o horário da exposição foi, entretanto, alargado das 18 para as 22 horas. Ainda assim, este domingo, não fizemos por menos e, às três em ponto, já lá estávamos. A M., radiante, a acenar com os bilhetes na mão. À entrada, tememos o pior: demos logo de caras com uma visita guiada, que enchia quase por completo a primeira sala, mas depois a coisa evoluiu sem problemas de maior, não obstante a grande afluência ― muita gente mais velha, mas também jovens e alguns pais acompanhados de filhos pequenos, que é de pequenino que se torce o pepino. Não me vou alongar sobre a exposição, que para isso há quem escreva com mais propriedade e conhecimento de causa, mas, a quem (ainda) não viu, aconselho vivamente. Até 15 de Janeiro.


(O Salto do Coelho, Amadeo de Souza Cardoso)

Impressionou-me a sua incrível paleta de cores ― não pude deixar de dar razão a Vasco Graça Moura, a quem ouvi dizer que há ali qualquer coisa de muito português na forma como usa o amarelo, o encarnado e o verde ―, o estar tão à frente do seu tempo (para quem viveu no princípio do século XX), e a mestria do traço, em especial nos desenhos a tinta da China. O facto de estarem expostas obras de seus contemporâneos é interessante, bem como alguns objectos do seu acervo pessoal que influenciaram a obra (nesses casos, a sinalização peca por omissão e somos nós quem têm de puxar pela cabeça). A maioria das obras está no piso 1, mas há uma parte, sobretudo desenhos e estudos (bem como três Modigliani pouco expressivos e um Picasso que passa quase despercebido), que estão no piso 0. Eu e M. não deixámos de nos sentir numa cave, sensaborona, que não convidou a demorar-nos muito no local. É pena.

Parte dois
Cultura faz um bem danado à alma, mas não sossega o estômago. Depois de M. repor os níveis de nicotina, dirigimo-nos à cafetaria. Durante anos, frequentei, de forma muito irregular, confesso, este espaço à hora de almoço, mas regressar agora, à hora do lanche, deixou-me um certo amargo de boca. O espaço interior é simpático ― chega mesmo a ser aconchegante numa tarde chuvosa; a esplanada é convidativa, e presta-se mesmo para quando faz sol no Outono ou no Inverno. Até aqui, tudo certo. A variedade de opções não é nada de outro mundo, mas também não é por aí. O pior é o horário. Então o horário da exposição foi alargado até às 22 horas (24 horas às sextas) e a cafetaria encerra à mesma às 17h45 (a esplanada às 17h30, mas aí, nada a opor)… Em nome de quê? Não seria muito mais sensato, para não dizer condizente com o estatuto da Gulbenkian, mantê-la aberta até mais tarde para atender as pessoas que, antes ou depois da exposição, querem fazer uma pausa para digerir o que viram? Ainda para mais quando a Gulbenkian continua a ser uma espécie de ilha entre a impessoal Praça de Espanha e a démodée Avenida de Berna.

Outra coisa: os jardins permanecem um lugar inspirador, mas de dia. Assim que escurece, a fraca iluminação, quase a raiar o absurdamente inexistente, torna tudo fantasmagórico. Não havia necessidade.

4 comentários:

Custódia C. disse...

Estarei lá caidinha no final do ano, nuns dias de férias que ainda tenho !!!!!

marta r disse...

Escusado será dizer que acredito em tudo o que escreves. Tudinho! Sou uma testemunha viva.

Anónimo disse...

Para a CCC:
Vale a pena. Eu, pelo menos, gostei.

Anónimo disse...

Para a Marta:
Por que será? :o))))