30.12.07

O brinde

Hip, Hip, Hurra!, P.S. Krøyer (1859-1909)


Com a chegada de mais um ano, não é a ideia de uma vida nova que me move, até porque estou satisfeito com a que tenho, mas antes a perspectiva de poder continuar a descobrir e a aprender coisas novas.
Um brinde a 2008!

22.12.07

O espírito


Neste final de ano, a vida deu-me como presente poder testemunhar esta quadra, de que tanto gosto, de diferentes perspectivas. E foi assim que me encantei com os preparativos em Viena; que voltei a ser criança quando as luzes da grande árvore do Badrutt's se acenderam pela primeira vez no dia 6, em St. Moritz; que nessa mesma manhã me juntei a um amigo que comigo quis partilhar a abertura dos chocolates de São Nicolau enviados pela família distante; ou ainda que dei por mim a achar que, bem vistas as coisas, uma lagoa, cercada por montanhas e por betão, com um dos mais belos entardeceres do Rio, é o local perfeito para uma árvore gigante flutuante. E no regresso a casa, alegro-me por tudo o que vi, mas também, e sobretudo, por continuar certo de que, na noite de 24 para 25, não vou querer estar em mais lugar nenhum do mundo. Só aqui.
A todos vocês, eu desejo um Bom Natal!

13.12.07

St. Moritz: parte 2

Corviglia, foto de Nuno Filipe Oliveira, D.R.

A estação do funicular em Corviglia serve de escaparate a grandes cartazes de marcas como a Jet Set e dá acesso directo ao empório gastronómico dos Mathis ― Hartly, o pai, e Reto, o filho. Suponho que a ideia seja a de não obrigar quem sobe apenas com o intuito de comer, beber um prosecco e/ou gozar o panorama a molhar desnecessariamente as botas ou os sapatos. Edificado a 2486 metros de altitude, o complexo onde estão os Mathis já existe desde 1964, pelo que, embora renovado e aumentado em 1994 ― depois de Reto e da sua mulher, Barbara, terem assumido o espaço em 1992 ―, não deixa de se me afigurar como um mamarracho. Os interiores também não encantam, mas há um factor inegável: o carisma de Reto, um dandy de olhos muito azuis, afável e habituado aos holofotes, o que faz do La Marmite, o restaurante de alta gastronomia por oposição aos outros no edifício, mais baratos e informais, uma referência da cozinha mediterrânica, com as trufas e o caviar a dominarem o cardápio.

Talvez por isso, Reto seja, uma vez mais, presença confirmada no 15º Festival Gastronómico de St. Moritz, um evento com chefes convidados de vários países (que perfazem um total de seis estrelas Michelin) e uma série de almoços, jantares e
cocktails de degustação, a muitos euros por cabeça, que fazem deste certame anual uma verdadeira “extravaganza” culinária.


Reto Mathis, D.R.


Johri's Talvo, D.R.


Reto Mathis só perde em mediatismo para Roland Jöhri, o chefe com duas estrelas Michelin, que tem, desde 1992, o seu restaurante na aldeia vizinha de Champfèr, ainda parte da cidade de St. Moritz. Instalado numa casa alpina secular, o restaurante Talvo, membro da Relais & Châteaux, é um ponto gastronómico incontornável, pois Jöhri, natural da região, combina a alta gastronomia francesa com a cozinha local e não enjeita influências mediterrânicas e asiáticas. Bem secundado pelo subchefe René Dittrich, mais um chefe pasteleiro e um bom sommelier, Jöhri faz também uma dupla de sucesso com a sua mulher, Brigitte, que se encarrega de bem receber. A simpatia não tem preço, mas a cozinha de excepção tem, logo só um prato principal pode custar facilmente 45 euros.

Mas voltemos a Corviglia. Com St. Moritz ainda a meio gás, nas suas pistas imaculadas, esquiadores e snowboarders deslizam sem atropelos e envoltos em nuvens reluzentes de pó de talco. Há quem diga ― com alguma propriedade, reconheço ― que tantas distracções acabam por encurtar o tempo disponível (ou será antes a vontade, que é pouca?) para os desportos de neve. Não sei até que ponto as estatísticas, as tais que apontam um número superior a 50% de visitantes que vem a St. Moritz pela vida mundana e não pelo esqui, serão exactas, mas existem aqui os meios e as condições ideais à sua prática.


Corviglia vista de Piz Nair

Apanho o teleférico que vai de Corviglia até Piz Nair, a 3057 metros de altitude. Como não existem pistas, a única atracção é a vista desafogada que se goza a toda a volta, pelo que há quem venha apenas para se sentir no topo do mundo, beber um copo ou fazer uma refeição ligeira no restaurante Panorama. Na hora de partir, esqueço-me de confirmar a veracidade de uma história caricata: o grego Constantine Niarchos, um milionário que terá sucumbido, em 1999, vítima de uma overdose homérica de cocaína no seu apartamento de Londres, duas semanas após ter conquistado o monte Everest, gostava tanto do vale de Engadine que não só terá financiado a construção do Panorama, onde tinha uma sala reservada, como terá conseguido que se criasse aqui um memorial depois da sua morte!


Alpina Hutte

Guardo o meu apetite para a Alpina Hütte. A meio caminho entre as plataformas de Piz Nair e de Corviglia, ela contradiz um pouco a ideia feita de que em St. Moritz tudo está pensado para que não se tenha de suar as estopinhas nas pistas. A pé, atinjo esta casa a muito custo e devo ser dos únicos na esplanada que não está devidamente equipado e com os esquis ou a prancha de snowboard pendurados à porta. A comida é excessivamente cara para a sua simplicidade, mas, num lugar onde até as cadeiras chegam de helicóptero, compreende-se e o panorama soberbo justifica-o.

12.12.07

St. Moritz: parte 1

Vista do quarto 409 do Badrutt's Palace, em St. Moritz


À entrada está estacionado um dos Rolls-Royce do hotel. O taxista, português como quase todos aqui, faz a manobra possível para me deixar o mais perto que consegue da porta principal, mas, ainda antes de perguntar quanto lhe devo, já me está a responder a uma outra questão que não fiz. Não em voz alta, pelo menos. A temporada está só a começar e ainda é demasiado cedo para as celebridades que, ano após ano, colocam St. Moritz nas páginas das revistas cor-de-rosa.

A reabertura do Badrutt’s Palace, que se dá religiosamente a 5 de Dezembro, é um catalisador da agenda social de St. Moritz. Não é para menos. Se esta estância fez do Inverno um acontecimento ansiosamente aguardado, tal só foi possível porque um senhor chamado Johannes Badrutt, após a compra de uma pensão de 12 quartos que esteve na origem do que é hoje o hotel Kulm, viu no vale de Engadine, no cantão suíço de Graubünden, perto da fronteira com Itália, potencial para tal.

É claro que na altura, em 1864, a ideia soava a um perfeito disparate; afinal, quem se podia dar a esse luxo tinha precisamente por hábito “refugiar-se” nas zonas mais temperadas da Europa para escapar aos rigores da estação. Foi então que Badrutt desafiou quatro amigos britânicos que costumavam passar o Verão no vale: eles voltariam no Inverno com a premissa de que se não gostassem, ele assumiria todas as despesas da sua deslocação e estada. Como acharam que não tinham nada a perder, aceitaram o repto, mas gostaram tanto que chegaram antes do Natal e só se foram embora depois da Páscoa.

O resto é história. O Badrutt’s foi o primeiro hotel dos Alpes a ostentar o nome Palace ― e o primeiro também a inaugurar uma arquitectura algo pesada que viria a fazer escola, arriscar-me-ia a acrescentar ― e só não perdeu a conta a todas as figuras sonantes que já acolheu ao longo dos tempos porque as suas identidades, e respectivas histórias, ficam devidamente registadas nos anais. É assim até hoje por mais sombra que lhe façam os seus concorrentes directos ― o Kulm, a Suvretta House e o Carlton, este último, aliás, reabriu em Dezembro, depois de uma remodelação de 40 milhões de euros, como o primeiro hotel de luxo da região só com suites.

Quem não está habituado a frequentar St. Moritz pode interrogar-se como uma cidade pequena, com uma população fixa que não chega aos seis mil habitantes, pode sobreviver apenas com duas temporadas ao ano ― de Dezembro a Abril e de Junho a Setembro ―, ficando os restantes meses adormecida e quase sem actividade. Pois tal só é possível porque para o grosso dos visitantes ― cerca de 63% são estrangeiros, com a Alemanha e a Itália na dianteira, a que não serão alheios a proximidade geográfica e o facto de aqui se falar alemão e romanche ―, independentemente de ter mais ou menos pergaminhos, de ser mais ou menos mediático, dinheiro não é problema e vêm dispostos a gastar muito em pouco tempo. Tão simples quanto isto.

E o que tem St. Moritz, e o Badrutt’s já agora, de tão especial para merecer a fidelidade de pessoas que vieram de férias com os seus pais e agora continuam a vir com os seus filhos? Da varanda do quarto 409, virada para o lago, avisto uma cidade dividida em Dorf, o centro com os seus hotéis, lojas e chalés, e Bad, a periferia com blocos de apartamentos e centros desportivos. Gostaria de dizer que formam um todo harmonioso, mas estaria a fugir à verdade.

Na realidade, o que explica até certo ponto o apelo irresistível de St. Moritz é, para começar, a sua localização, entre montanhas e à beira de um lago, mas também, e sobretudo, uma vivência mundana muito própria proporcionada por locais badalados, eventos como corridas de cavalo e campeonatos de pólo no gelo que obrigam a reservar alojamento com grande antecedência e uma mão cheia de chefes talentosos que, longe de se limitarem a recriar especialidades locais como a gulosa tarte de nozes e mel, podem praticar uma cozinha de autor e fazer-se cobrar por isso. Só depois vêm o esqui e os outros desportos.

Pode parecer que estou a perverter a ordem natural das coisas, mas, ironias à parte, não ando muito longe da verdade. O Badrutt’s, mais uma vez, é bom barómetro deste frenesim social de St. Moritz. Claro que o hotel leva os seus hóspedes até ao funicular e vai buscá-los no regresso com direito a chocolate quente, mas o que parece contar mesmo é que entre os seus restaurantes possui um Nobu, o japonês mais famoso do mundo; que os muitos cadeirões e sofás do seu grande hall não chegam para sentar toda a gente que ali se reúne no pós-esqui para ver e ser vista; ou ainda que o seu concièrge não se acanha, como assisti certa noite, a fazer os telefonemas necessários para conseguir uma passagem aérea de última hora entre Nova Iorque e Casablanca se isso lhe for pedido.


Chesa Futura, em St. Moritz, D.R.


Seja como for, St. Moritz não se resume aos salões do Badrutt’s. A abertura oficial da temporada de Inverno 2007-2008 começou a 24 de Novembro, mas, à semelhança do que sucedeu em anos anteriores, a maioria dos estabelecimentos só reabre entre a segunda e a terceira semanas de Dezembro. Acontece que as condições meteorológicas dos últimos meses têm permitido honrar, como uma fartura como há muito não se via, a tradição de St. Moritz, que se gaba de possuir neve de 1 de Dezembro a 1 de Maio, pelo que alguns, não muitos, anteciparam a sua abertura. Melhor ainda quando à neve se junta um sol radioso, o que parece não ser nada de extraordinário por aqui ― os manuais locais, pelo menos, não se cansam de frisar que tal fenómeno se deve à alta atitude e ao alinhamento das montanhas.

Do conjunto de montanhas com infra-estrutura para a prática de desportos de Inverno que cerca St. Moritz, Corviglia é, sem dúvida, aquela que fica mais acessível. O funicular sai da via San Gian, mas obriga a uma mudança em Chantarella. Vale a pena fazer uma paragem aqui, sobretudo ao entardecer, pois é um dos melhores pontos de observação da cidade à beira do lago e uma boa maneira de apreciar de perto os chalés rústicos e os blocos de apartamentos, destinados apenas aos muito ricos, que cravaram os seus alicerces nas encostas íngremes.

É o caso da Chesa Futura. Desenhado pela firma de arquitectura do britânico Norman Foster, o arquitecto-estrela armado cavaleiro pela rainha, este bloco de apartamentos ― e diz-se que Foster, incondicional de St. Moritz, reservou a penthouse para si ― foi construído em madeira, vidro e aço e, como começa ser hábito na obra mais recente de Foster, a sua peculiar forma orgânica já lhe valeu a alcunha de “amendoim”. Parece-se mais a um feijão, mas o certo é que criou uma nova marca indelével na paisagem da cidade. Depois, goste-se ou não, faz uma fusão notável entre a engenharia de ponta e técnicas locais ancestrais de construção.

10.12.07

Perdições (13)


Nem tinha ido à loja com o propósito de fazer qualquer compra, mas assim que bati o olho neles já não consegui sair de lá sem eles. Afinal, não são todos os dias que se encontram uns ténis-bota All Stars da Converse em pele e camurça. ADORO.